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Um blogue do professor Manuel Ramos

Jornal Referência Opinião

Jantar, à luz das velas

E lá tivemos mais um jantarzinho, à luz das velas, no Panteão Nacional…

A palavra «panteão» deriva da junção do prefixo “pan”, que significa “todo”, com o sufixo “théos”, que significa “deus”. Numa palavra, panteão significa “todos os deuses”, que, com o passar do tempo, transformou-se em “local onde todos os deuses estão expostos”…

Ora, se entendermos que uma pessoa notável é uma espécie de um “deus terreno”, podemos entender que os mausoléus onde os restos mortais dessas pessoas estão depositados são também eles panteões…

Assim, podemos entender que o panteão nacional nada mais é do que um mausoléu, onde descansam os restos mortais de portugueses que tiveram importância pelos seus feitos…

Este, o Panteão Nacional, localiza-se na Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa, e foi criado por Decreto de 26 de setembro de 1836, com a intenção de homenagear a memória dos cidadãos portugueses que se distinguiram pelos serviços prestados ao País, quer no exercício de altos cargos públicos, quer no exercício de funções militares, quer na expansão da cultura portuguesa, na criação literária, científica e artística, ou na defesa dos valores da civilização…

Ora, na área do Panteão Nacional onde fizeram a jantarada do “Web Summit”, não há túmulos com restos mortais, mas apenas cenotáfios, que são monumentos fúnebres sem restos humanos no seu interior, dispostos ali apenas para homenagearmos as pessoas ali representadas.

Permitam, entretanto, que vos faça uma pergunta: como podemos homenagear esses portugueses ilustres durante um almoço (ou jantar, ou mesmo um cocktail)? Não estão eles já mortos? Ou será que, enquanto defuntos, fazem “uma boquinha”?

Será que algum dos leitores gostaria que fizessem uma jantarada regada com vinho (ou não) por cima da lápide da sua campa?

Eu (pessoalmente) não gostaria, apesar de achar que não me importaria muito com isso depois de morto…

Ocorre, no entanto, que a ideia de poder haver quem entorne vinho no chão ou deixe cair migalhas ou ossos de frango perto dos cenotáfios não é propriamente representativa de respeito ou indicadora de especial apreciação pelos feitos das pessoas homenageadas no Panteão Nacional, sendo mais de considerar o contrário…

Não interessa muito de quem é a culpa dessas jantaradas… Não há interesse por aí além em descobrir os responsáveis por elas! Apesar disso, é importante termos conhecimento de que o aluguer de monumentos nacionais para iniciativas privadas, limitadas a uma elite, descredibiliza a importância desses monumentos.

Nestes termos, a utilização dos monumentos nacionais para fins pouco nobres e particulares, ainda que possa gerar algum dinheiro (não faço ideia da dimensão das receitas obtidas por esse meio), pode gerar também problemas como resultado da sua má utilização, quer em termos físicos (verificados quando existem danos físicos no monumento), quer em termos morais (como fonte de descrédito para a própria nação que na gestão dos seus monumentos, demonstra não se importar com a forma através do qual é utilizado).

De qualquer forma, o passado ninguém altera e, tanto quanto eu saiba, já fizeram no Panteão Nacional alguns jantares… Isto levanta algumas dúvidas: Que tipo de pessoas aceitaria jantar num mausoléu (Panteão Nacional)? Que tipo de empresas acha que é uma boa ideia fazer um jantar num mausoléu (o Panteão Nacional, que por acaso, até é monumento nacional)? Que tipo de ementa será que servem nesses jantares? Que tipo de indivíduo faz este tipo de perguntas?

Questões que, como o leitor há de concordar, são fulcrais para a compreensão de toda esta história…

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