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Um blogue do professor Manuel Ramos

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A Páscoa dos nossos dias…

A Páscoa é uma das mais importantes festas religiosas comemoradas pelos cristãos e, para estes, simboliza a ressurreição de Cristo, ocorrida três dias depois da sua morte. Está muito ligada à Páscoa judaica, que comemora a fuga dos israelitas da escravidão do Egito e a sua posterior viagem através do deserto até ao monte Sinai, onde
Javé (Deus) lhes prometeu a terra de Canaã (a “Terra Prometida”) como recompensa pela sua fidelidade.

Essa fuga ocorreu porque, como o faraó do Egito não queria libertar os israelitas, Deus infligiu aos egípcios dez terríveis pragas (as “10 Pragas do Egito”), que consistiram em: um rio tinto de sangue, uma infestação de rãs, outra de piolhos e outra de moscas, na morte de animais de criação, no nascimento de pústulas em pessoas e animais, numa queda de granizo, numa nuvem de gafanhotos, no tapamento do Sol, que provocou escuridão por três dias e finalmente na morte dos primogénitos das pessoas e dos animais.

O faraó, que resistiu até ali a libertar os hebreus, desistiu e deixou-os
fugir…

Assim, a Páscoa judaica celebra, sobretudo, a libertação do povo de Deus dos seus opressores, através da imposição de castigos divinos sobre os seus opressores…

Ao meu ver, a história narrada acima, sendo real ou não, pode ser vista como uma alegoria que narra a luta do ser humano (representado pelos judeus) contra o cativeiro provocado pelos vícios contemporâneos (representados pelos egípcios e o seu faraó). Nesta alegoria, temos de ponderar que os vícios só recebem esse nome por representarem comportamentos do ser humano, capazes de simultaneamente dar prazer (representado aqui pelo desejo do faraó de manutenção da escravidão dos judeus) e, ao mesmo tempo, provocar consequências (representadas pelas “10 Pragas do Egito”)…

Neste momento, o leitor deve estar a pensar: “Que alegoria mais sem noção…” e eu retruco com uma pergunta: Já alguma vez leu o provérbio popular que diz que “A mil chegarás, de dois mil não passarás.‘? Pois é! Esse provérbio indicou como final dos tempos o ano 2000, o que, como sabemos, não aconteceu! Já se passaram 20 anos desde aí
e ainda estamos todos vivos!

Bem… Todos, é maneira de dizer! Afinal, morreram muitas pessoas nesses 20 anos! Só de 2019 para cá, com essa pandemia do Covid-19, vejam só quantos morreram…

Pensando bem, não foi só aí que morreram muitas pessoas…

Vejamos:

Em 2000, no Congo, morreram cerca de 128 pessoas num surto conhecido por “Febre Hemorrágica de Marburgo”. Em 2003, na China, morreram 754 pessoas com a epidemia da “Síndrome Respiratória Aguda Grave – SARS”. Em 2005, ocorreu a “Gripe das Aves”, com cerca de 200 mortes na Ásia. Também nesse ano, Angola apresentou 252 casos de óbitos com a epidemia “Febre Hemorrágica de Marburgo”. Em 2009, no México, morreram 284 mil pessoas com a “Gripe Suína”. Em 2012, foi a vez da “MERS – Síndrome Respiratória do Médio Oriente” matar 858 pessoas. Em 2014, um surto de “Poliomielite” matou um número desconhecido de pessoas em, pelo menos, três áreas do globo (Ásia Central, Médio Oriente e África Central). Também em 2014, o mundo sofreu com medo do “Ébola”, que
provocou mais de 11 mil mortes na África Ocidental. Em 2019, o “Ébola” voltou a atacar, desta vez, no Congo, com cerca de duas mil mortes. Também em 2019, mas com prolongamento até agora, temos a pandemia do “Covid-19” que até esta data matou mais de 30.851 pessoas em todo o mundo…

Não sei se o leitor contou, mas do ano 2000 até agora foram, pelo menos, 10 epidemias… dez pragas, que totalizaram 303.043 mortes, no mínimo. Dez! O mesmo número de pragas que fez o faraó do Egito libertar os hebreus…

Na alegoria que referi sobre as dez pragas do Egito, as pragas decretadas pelo Deus de Israel foram motivo de reflexão pelo faraó e fizeram com que ele mudasse a sua postura de avareza, de soberba
e de egoísmo.

Também as pragas referidas, ocorridas desde o ano da virada do milénio, deverão ser motivo de reflexão sobre os caminhos que estão a ser tomados por todos nós, que vivemos em sociedade.

Por exemplo, a avareza de alguns, que implica a pobreza de muitos, pode explicar os produtos que podem ser encontrados em certos mercados populares asiáticos, onde as condições de higiene são duvidosas e onde podem ser encontrados até morcegos e cobras, que embora possam ser consideradas iguarias populares, são frequentemente perigosos (tendo em conta a falta de controle sanitário e a possibilidade destes animais serem portadores de vírus
ou de outros microrganismos nocivos ao ser humano).

Outro exemplo demonstra o estado do egoísmo atual, que, em conjunto com a soberba, explica as atitudes das pessoas que, mesmo quando são conhecedoras dos riscos, não se coíbem de fazer coisas que podem fazer alastrar o contágio das doenças…

Por outro lado, a arrogância, o medo e a irracionalidade explicam os ataques físicos e/ou virtuais (tão comuns, infelizmente) que ocorrem contra pessoas, simplesmente por elas serem diferentes, por elas pensarem diferente ou por elas estarem com problemas…

Nesta época do Covid-19, caro leitor, desejo que seja reflexivo…

Reflita em tudo que disse acima… Reflita sobre as pessoas que gosta… Reflita sobre seus vizinhos… Reflita sobre os seus amigos e sobre os seus inimigos… Reflita sobre Deus, seja ele qual for (se o amigo leitor não for ateu ou agnóstico)… Por fim, reflita sobre si mesmo…

Depois, faça a sua Páscoa! Uma Páscoa que, se calhar, terá menos chances para engordar com os chocolates… Uma Páscoa que não significará, com certeza, almoçar com toda a família no Domingo, num restaurante cheio, depois de esperar não sei quanto tempo pela mesa que reservou… Uma Páscoa na qual, provavelmente, não estará num hotel
longínquo, que chegou depois de viajar durante horas no seu carro ou num avião, mas sim na sua casinha querida… Uma Páscoa na qual vai ser muito mais importante para si ouvir um telefonema de alguém que gosta, do que gastar os seus tostões em lembranças, ovinhos de Páscoa e bombons…

Feliz Páscoa!

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